Oku Saka

Lídia Jorge desafia pureza étnica e populismo nas celebrações do Dia de Portugal

Lídia Jorge, na cerimónia oficial do Dia de Portugal, em Lagos, desafiou os discursos de conforto e lançou um apelo vigoroso contra o racismo, o populismo e o apagamento da memória histórica. O seu discurso, de quase meia hora, foi um dos momentos mais intensos da celebração, pela coragem, pela lucidez e pelo incómodo que provocou.

Lídia Jorge

Com uma visão inclusiva e humanista, a autora abordou um tema fracturante no actual debate político português, a questão migratória. Lembrou: 

“somos descendentes do escravo e do senhor que o escravizou” e que a ideia de identidade pura não passa de uma ficção perigosa. Evocando dados históricos, destacou que, no século XVII, cerca de 10% da população portuguesa teria origem africana, o que destrói a narrativa da homogeneidade étnica.

Mais do que um discurso comemorativo, foi uma denúncia. Denúncia da “fúria revisionista” que grassa pelos extremos ideológicos, do “poder demente aliado ao triunfalismo tecnológico” que transforma cidadãos em simples “seguidores” de espectáculos efémeros e manipulados por algoritmos. A escritora foi taxativa: o espaço público está a ser degradado e as redes sociais estão a inverter a lógica democrática ao premiar os que menos merecem. “O escolhido passou a ser o menos exemplar, o menos preparado, o que mais ofende”, afirmou.

A crítica estendeu-se ao cenário internacional, com uma alusão direta ao presidente norte-americano, que declarou num comício: “adoro os pouco instruídos”,  frase que, segundo Lídia, expõe o perigo da anti-intelectualização e da manipulação de massas. 

No fecho, deixou a pergunta que ecoou entre os presentes e nas redes: “Qual é o conceito hoje em dia de ser humano, como proteger esse valor que até há pouco funcionava e não funciona mais?” Um questionamento que transcende fronteiras e exige respostas urgentes.

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