O termo soa moderno, participativo e até emancipador, mas por trás da palavra “auto-construção” esconde-se uma verdade dura: os jovens angolanos estão a construir o que o Estado deixou de garantir.
Mais de 60% da população tem menos de 25 anos, e a maioria vive entre o desemprego, o subemprego e o mercado informal. Para esta geração, o direito à habitação é um luxo fora de alcance. A chamada “auto-construção” surge, então, não como escolha, mas como imposição.
O Programa de Auto-Construção Dirigida, aprovado em 2023, previa 910.600 lotes infraestruturados em todo o país. Na prática, muitos desses terrenos continuam sem água, luz ou saneamento. E os jovens, sem acesso a crédito, são excluídos dos critérios de participação.
O que o discurso oficial apresenta como “empoderamento popular” tem servido, em muitos casos, para transferir a responsabilidade pública para o cidadão. O jovem que constrói a própria casa é celebrado como resiliente, quando na verdade está a compensar a ausência de uma política habitacional justa.
Como observou o arquiteto John Turner, “as pessoas não são o problema da habitação, elas são a solução” — mas isso não significa que devam enfrentar sozinhas o peso da exclusão.
A auto-construção poderia ser uma via legítima de emancipação, se viesse acompanhada de infraestrutura, crédito, formação e assistência técnica. Sem isso, torna-se apenas o reflexo de um sistema que romantiza a luta individual e desresponsabiliza o poder público.
Em Angola, milhares de jovens estão a construir casas com as próprias mãos, mas o que realmente constroem é um testemunho da desigualdade: paredes levantadas sobre o vazio de políticas eficazes.
A “auto-construção” pode ser o nome bonito da exclusão, mas também o grito silencioso de uma geração que se recusa a desistir do direito de habitar o seu próprio país.
